domingo, outubro 29, 2006

 

A Solidão do Coronel

Confirma-se. "Ninguém Escreve ao Coronel".
Este título, de um excelente romancezinho de Gabriel Garcia Marquez, é também o nome da minha ansiedade batida com um q.b. de deixa lá, sempre que abro o meu desafortunado bloguinho e se me mantém servido um zero de comentários.
A língua portuguesa é, porém, mais generosa e separa avisadamente o ter do ser em sede de zeros e de zoilos. Estou, por certo, bem. Amem.

 

Orgulho Pátrio

Aluga-se, arrenda-se, vende-se, passa-se, trespassa-se, dá-se à exploração! - Eis o colorido das bandeiras nacionais nas janelas das nossas casas e nas montras das nossas lojas, a alevantar bem alta a euforia do momento.


domingo, outubro 08, 2006

 

SOPHIA

Gosto de receber livros. Há dias, ofereceram-me um que possuo há trinta anos, e que li trinta vezes. Senti-me, ainda assim, muito enaltecido com o gesto. É o "Contos Exemplares", de Sophia, 35ª edição, eu tinha a 17ª. Tudo da Editora Figueirinhas.
Leio sempre os textos desta esplêndida senhora, com os quais rezo, pois encontro neles, tal como na Bíblia, sempre novidade, sempre transcendência.
E no seu conto "O Jantar do Bispo" revisito a imensurável dignidade de Abel Varzim, o padre e sociólogo dos trabalhadores, um profeta dos nossos dias ainda desconhecido de muitos, apesar de haver imensos textos dele e sobre ele, alguns até, nesta mesma caixinha.


quinta-feira, outubro 05, 2006

 

O DESEMBRULHO

Desesperar por quê, se o futuro são presentes que hão-de vir, e pode, cada um, desembrulhar os seus presentes?


domingo, outubro 01, 2006

 

CAMINHADOR


Quer se cruzasse connosco na rua quer passasse por baixo da nossa varanda, era um regalo de alma contemplar aquela figura caminhadora a que vou chamar Miguel, sempre de jornal ou livro aberto sob os olhos, estes também levemente andantes mas em sentido transversal.

Os pés de Miguel eram como que uma teia de tear, sempre longitudinais, e os seus olhos uma trama, sendo que o conjunto do quadro resultava num sublime tecido de seda exposto como bandeira ao vento.

A Miguel quase não era possível perguntar o que andas a ler. É que ele lia sempre a andar.

Miguel, meia-idade bem conservada, nem alto nem baixo, de cabeça meio calva e meio cãs, era uma simpática figura da cidade. Não se sabia a sua profissão e o seu ar enigmático situava-se entre o intelectual interessado e o autodidacta laborioso.

Como se não demorava nos cumprimentos, de resto sempre dados com imensa cortesia, todos se ficavam a interrogar sobre aquela tão eminente personagem que parecia obstinada no aparente paradoxo de apelar às palavras com o seu mais circunspecto silêncio.

Miguel, lia e caminhava. Era como se falasse.

É de muito bom-tom a gente ler, meditar e pôr-se a caminho. Miguel, ao ler, ia já a caminho e deixava todos a meditar.

Já há muito que se não vê passar Miguel e todos dão agora conta da falta que ele faz. Este seu virar de página trouxe ao bairro o desassossego do desencontro entre o caminhador de sempre e quem, passivamente, sempre se alimentou dos seus passos.

 

FRUGALIDADE

Que boa fortuna esta, a de ter quase tudo
do quase nada que preciso.

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