domingo, março 22, 2009

 

Flache da Semana -11


Uma turma "especial" de ciganos de uma escola do agrupamento Abel Varzim, em Barqueiros, Barcelos, foi esta semana pretexto de arremesso politico e objecto de boa facturação na comunicação social. O facto tinha cerca de dois anos, mas só agora nasceu o caso. Isto é: havia um facto antigo que só agora, em ano de três eleições, atingiu a sua idade de facto politico.
A notícia causou polémica porque, supostamente, estava um grupo de jovens ciganos a ser discriminado, por receber as suas lições escolares numa turma "especial" quase exclusivamente de ciganos. Quase, mas não só, por sinal.

Trata-se de um grupo que não frequentava a escola, com idades entre os nove e os dezoito anos, e a DREN resolveu ir buscá-los a casa e organizá-los, provisoriamente, naquela solução.

A mim nada me choca a opção da DREN, a mim que sou auxiliar numa das mais cosmopolitas escolas da região: com muitos ciganos e alguns romenos, russos, ucranianos, guiné-bissauenses, angolanos, brasileiros e outros; estando todas estas minorias perfeitamente inclusas.

Não me choca mesmo nada que se possa encontrar soluções específicas para casos especiais, desde que isso faça parte de um plano integrado de incluir.

____________________________________De resto, o eminentíssimo patrono daquela escola, o padre-sociólogo Abel Varzim, ensinou, no seu tempo, como se pode promover e dignificar as pessoas a partir do seu meio e da sua cultura. Ele fundou, nos anos trinta, em Portugal, uma importante organização que, na base, estava subdividida por extractos sociais, por género e por idade, porque, no contexto, era necessário impedir que os mais ricos mandassem nos mais pobres, os homens mandassem nas mulheres e os adultos mandassem nos mais novos. Essa organização teve o seu tempo, mas ofereceu à politica, aos sindicatos, às empresas, à sociedade, muitos quadros éticos e profissionais de excelência. Chamava-se Acção Católica a esse importante movimento. Eu fiz parte dele. Estávamos separados, mas por óptimas razões. Desse modo, na ausência de "elites" no meu organismo - a Juventude Operária Católica JOC -, até eu pude ser dirigente com 16 anos. E era ainda no tempo da outra senhora, em 1972, sendo eu, então, pouco mais que analfabeto.
Também hoje têm o seu cantinho as mulheres socialistas, os trabalhadores sociais-democratas, os jovens comunistas. E legisla-se sobre quotas para mulheres e outros grupos nas listas eleitorais.Tudo isso são medidas da chamada discriminação positiva, adoptadas em benefício da inclusão e da cidadania.

(Aproveito para deixar estas duas sugestões de livros).


quinta-feira, março 19, 2009

 

Valores e Emergências


"Não se resolve o problema da sida com preservativos. Pelo contrário, o seu uso agrava o problema."
- Estas foram as palavras muito justamente desastradas de Sua Santidade Bento XVI, entretanto remediadas pelo porta-voz da Santa Sé , padre Frederico Lombardi, que fez questão de esclarecer que o Papa "apenas disse que o mais importante é repensar os comportamentos e os valores".
Trata-se, portanto, de duas lutas diferentes: uma a médio/longo prazo, que é a luta oficial da Igreja, muito nobre e respeitável; e a outra a luta pela vida, no imediato, que pede e exige a distribuição de preservativos em larga escala, e esta luta é impelente e crucial.
Também a minha Igreja está agora muito entusiasmada a salvar pessoas através do chamado Banco Alimentar Conta a Fome. Eu sou dos que pensam que o seu uso sem rigorosos critérios, agrava o problema que se pretede solucionar. Mas que o banco está a ser preciso, lá isso está.
Deixemo-nos então de pruridos primários e ajudemos as pessoas pelo pão e pela saúde.


quarta-feira, março 18, 2009

 

"Ó Pai, Porque é Que o Padre Estava Sempre a Falar de Sexo?"


Sua Santidade Bento XVI, volta a ocupar o seu preciosíssimo tempo com declarações sobre o preservativo. Desta vez deslocou-se mesmo a África - o continente mais flagelado por todos os géneros de atentados à vida humana - para falar sobre a "camisa".
O que fica dito é, grosso modo, o que diz a comunicação social, blogues incluídos. Por isso me interrogo se haverá, ou não, um grave problema de discurso na Igreja Católica; ou se estamos, ou não, diante de uma enorme confusão na ordem de prioridade dos valores essenciais.
Ser o preservativo uma questão, parece-me, de todo, coisa ridícula. O meu catolicismo não está em causa; mas fico muito desapontado com certas campanhas da minha Igreja. Lembro-me sempre, nestas ocasiões, de uma pergunta inocente de um dos meus filhos, ainda muito criança, no fim de uma missa, numa aldeia, celebrada por um sacerdote de outros tempos: "ó pai, porque é que o padre estava sempre a falar de sexo?"
A minha Igreja e a minha fé têm muito melhor do que isto. Só tenho pena que não se saiba...


domingo, março 15, 2009

 

Flache da Semana - 10


Estão de parabéns a CGTP e, indirectamente, o PCP e o Bloco de Esquerda, que conseguiram juntar 200.000 pessoas numa manifestação, na sexta-feira passada em Lisboa, contra as políticas do governo PS.
Esta foi uma verdadeira manifestação unitária, uma vez que juntou, a uma só voz, duas causas diferentes, uma delas a dos espoliados do emprego e do salário, os precarizados do trabalho e da vida, os excluídos de todas as inclusões; a outra a dos detentores dos "direitos irreversíveis", nomeadamente a dos professores "do quadro"(efectivos).
Não imagino do que terão falado entre si, nas camionetas que os levaram à capital, os protagonistas destas duas causas. Mas seguramente não falam a mesma língua um desempregado a quem caducou o subsídio de desemprego e não vislumbra a mais ténue luz ao fundo do seu túnel; e um professor médio (com um emprego seguro para toda a vida e um salário de 2.500 euros) que diz lutar contra a avaliação da sua prestação profissional; contra a ideia das promoções por mérito e não só por antiguidade; e contra um modelo de gestão escolar que pretende mais eficiência e responsabilização.
Não há dúvida que a CGTP, o Bloco e o PCP estão de parabéns por mais esta manifestação e por esta quadratura do círculo (vicioso?), mas eu não acho nem um bocadinho que estejam a fazer um bom trabalho.


domingo, março 08, 2009

 

Notícias de Excepção...(!?)



Estou muito tranquilo porque sei, desde há muito, que a excepção, o disparate e o absurdo é que dão direito a notícia. Noticia-se o ter um homem mordido num cão, porque ter um cão mordido num homem não espanta ninguém. Assim, os factos estapafúrdios que nos chegam ao conhecimento só nos devem confortar porque são uma excepção que confirma a regra de sentido contrário.

Esta semana veio à baila o facto de um programa de jogos no computador magalhães ter erros de português. Um programa, que vai ser retirado de imediato, a confirmar que os milhentos conteúdos e possibilidades daquela excelente maquineta são uma grande coisa.

Também nos chegou uma notícia que diz que o arcebispo de Olinda e Recife, no Brasil, "excomungou" uns pais e uns médicos que, para salvar a vida de uma menina de nove anos, estuprada pelo padrasto e grávida de gémeos, procederam a um aborto legal.

Do primeiro caso, está tudo dito. Do segundo, do arcebispo já "excomungado" por todo o mundo, também não me suscita nem uma palavra, pois as suas desprezíveis declarações apenas me vêm concentrar na figura do seu antecessor naquela arquidiocese, Helder Câmara, o "Arcebispo Vermelho" - um santo adoptado pelos pobres e também "excomungado" pela ditadura militar -, com quem tive o raro privilégio de estar em Roma, em 1991, no centenário da Rerum Novarum.

É estranho mas, para mim, notícias são o contrário de notícias.

Na foto, estou de camisola verde ao lado direito do arcebispo.


sábado, março 07, 2009

 

Flache da Semana - 9























Hoje, falo da Semana da Leitura, na Escola EB1/JI do Fujacal, que decorreu até ontem.
Foi uma semana muito animada. Tivemos uma feirinha de livros muito frequentada e com vendas que confirmam o muito interesse que têm os nossos jovens alunos e as suas famílias pela leitura.
Muitos pais, avós e outros encarregados de educação, deslocaram-se às salas de aula para lerem ou contarem as suas histórias preferidas, e vários escritores, mais ou menos consagrados, foram ao pavilhão principal dar as suas conferências, falar dos seus livros e oferecer autógrafos.
Houve também espaço para a leitura em línguas estrangeiras, dado o cosmopolitismo da nossa escola, frequentada por meninos de várias nacionalidades.
A mim, que sou o porteiro desta nobríssima escola, foi-me dada uma possibilidade de intervir no encerramento desta Semana de Leitura. Resolvi apresentar um monólogo a que dei o título de "Hospital de Livros", no qual pude simular a encadernação e o restauro de livros que em tempos aprendi nas Oficinas de S. José, em Braga; propor uma canção que preparei para o acto; e encenar uma história igualmente da minha autoria para o momento.
Enfim, foi uma semana de verdadeira escola democrática - e cultural! -, com o contributo de todos.
Registo a história que ocupou parte daquele meu monólogo:

"O Livro Grande de João-Pimpolho

Aquilo não lembra nem ao diabo! – costumava dizer o avô do João-Pimpolho, de olhos muito arregalados, a boca um pouco aberta de espanto…

Bem!, o querido velhinho, parecia estar a regressar de um virtual planeta de livros muito antigos, deliberadamente para se assarapantar com os descobrimentos, as engenhoquices e a habilidade de tão fadado neto.

E aquele avô - babadinho - estava sempre a repetir:

- "O rapaz é jeitoso. Vai dar homem".

Às vezes até se via uma lágrima de cristal a descer pelo leito fundo e curvo de uma ruga que havia no rosto do avozinho. Era a sua felicidade, que já não cabia toda lá dentro. E nestes momentos até o idoso soluçava um pouco nas palavras para lembrar a todos o que já não era necessário:

- “O rapaz é jeitoso”.
- “Faz coisas que não lembram nem ao diabo”.
- “Vai dar homem. Ai isso vai”.

Para a bola, o João-Pimpolho já nascera ensinado. Tinha treinado muito na barriga da mãe, e esta, que ainda não tinha ido ao exame de ecografia saber do sexo da criança - e porque é costume pensar-se assim! -, dizia às suas amigas:

- “Vai ser rapaz! Está sempre aos chutos”.

As amigas riam-se; tocavam naquele ventre gorducho, e reconheciam:

“Na verdade, quem está cá está muito animado”…

Pimpolho nascera à sexta-feira ao fim da tarde, parecia já interessado em ir de fim-de-semana. A mãe, muito emotiva, disse logo:

- “Ao escolher este dia para nascer é porque gosta de viajar. Quer conhecer o mundo”.

O avô, disse, da sua sabedoria antiga:

- “Abençoado seja Nosso Senhor, que o rapaz é perfeito. Tem umas orelhinhas que parecem mesmo as do Menino Jesus”.

A avó beijocava-o, enternecida, não dizia nada porque assim dizia tudo, mas, pela observação minuciosa do corpito, devia estar a pensar:

- “Ai estes olhinhos são mesmo do meu lado. Todos nós temos os olhos castanhos”.

Também vieram os outros dois avós, também achavam que o petiz era todo do seu lado:

- “Esta barbelinha é da avó, que ninguém lha tira” – disse o avô materno.

O pai parecia um executivo, todo em movimentos impulsivos tratando das papeladas, sobretudo inquietava-o a necessária urgência de registar o seu grande achado, que não era senão, nem mais nem menos, o sonantíssimo nome de João-Pimpolho.

Enfim, estava o crianço em grave perigo de vir a ser estragado com mimo.

O que valeu mesmo a João-Pimpolho foi, desde logo, a sua altiva independência. O rapaz começou a crescer e a revelar-se com jeito para tudo, mas o que mais nele impressionava era a sua enorme curiosidade. Estava sempre a perguntar às coisas: porque é que tu és assim?
Perguntava, por exemplo, a uma bola:

"Ó bola, se tu rebolas, tem de haver uma razão,
Porque há bolas que voam, como as bolas de sabão.
E se o mundo é uma bola como o globo da escola,
Então o mundo rebola melhor que uma cebola.
Ou esta gente está tola, e isso não me consola,
Ou uso a minha tola, que também é uma b
ola".

E de tanto perguntar estas coisas às coisas, e de tanto pensar no assunto, o João-Pimpolho, uma noite, teve um sonho muito auspicioso:

Bem, o mundo já é mundo há muito tempo e já muita muita gente, desde há muito muito tempo, muita gente deve andar a perguntar coisas às coisas. Essas perguntas e respostas” - sonhou João-Pimpolho -,“só podem estar num livro muito grande e muito antigo onde decerto toda a gente que já nasceu e viveu em todos os tempos e lugares, deve ter escrito um bocadinho”.

Esse sonho andou sempre a passear na cabeça de João-Pimpolho, mesmo depois de ele já estar acordado, e assim andou sempre a passear na sua cabeça até ao dia em que entrou para a primeira classe da Escola EB1/JI do Fujacal, em Braga.

No primeiro dia de escola, a senhora professora, para desanuviar, perguntou logo, à vez, a cada menino e menina, o que queria ser quando fosse grande.

E cada menino disse o que queria ser, tudo profissões importantes: O Miguel queria ser engenheiro de submarinos, o António preferia os ares e disse que queria ser astronauta, a Matilde aspirava a ser rainha, a Ana tinha o sonho das artes plásticas.

O João-Pimpolho tinha-se deixado ficar para o fim e já parecia à senhora professora que dali ia sair um miúdo muito tímido.

Porém, João-Pimpolho, que estivera a escolher as palavras para o seu discurso, disse:

- “Senhora Professora, eu queria ser escritor para escrever um bocadinho no livro grande do meu sonho”.

Os outros meninos ficaram muito assarapantados com a futura profissão de Pimpolho, e a senhora professora, essa, ficou curiosa.

Então, João-Pimpolho explicou que se tratava de um livro de mais de mil folhas, um livro muito grande, onde escrevera toda a gente que andara por todos os sítios, em todos os tempos, à face da terra.

Eu acho que todos os meninos daquela turma compreenderam o sonho que vivera muito acordado na cabecinha de João-Pimpolho".

Braga, 28 de Fevereiro de 2009


quarta-feira, março 04, 2009

 

Com a Devida Vénia - 8


"O futuro vai depender muito menos de heróis do que de pessoas que funcionem de modo cristão, sejam ou não religiosas".


Júlio Machado Vaz, hoje na RDP1, comentando a actual obamania americana.


domingo, março 01, 2009

 

Flache da Semana - 8


Esta semana fica marcada politicamente pelo congresso do Partido Socialista.
Foi um evento notável, marcado por um líder incontestado e por uma organização muito profissional.
Só fico um pouco perplexo com tanta unanimidade; com tantos dirigentes a dizer o mesmo da tribuna; e com tantos militantes, nos corredores, a fazer idênticas declarações à comunicação social. Uma massa tão acrítica, também não me agrada. Faz muito bem o contra-ponto com o fala-baratismo do PSD, que é péssimo; mas eu, sinceramente, preferia um ambiente meio-termo. Parece que os sociais-democratas estão a ser pouco responsáveis e os socialistas pouco livres. E só falo hoje destes dois partidos por razões comparativas.

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